Convergências Entre os Teóricos Erich Fromm e Eric Berne

Painel apresentado em congresso
por Aline Melo de Aguiar e José Silveira Passos

O objetivo deste estudo é apresentar os pontos de convergência entre as teorias de Erich Fromm e Eric Berne, teóricos da Psicologia que tiveram o auge de suas produções nos EUA no mesmo momento histórico (década de 60) e que contribuíram com mudanças significativas para o olhar da Psicologia sobre o potencial de desenvolvimento humano e sobre a influência do meio ambiente e da cultura na constituição do psiquismo. Fromm fazia parte da esquerda Psicanalítica, ou Neopsicanálise, que abrigava os estudiosos que acreditavam na influência da cultura na formação do indivíduo; Berne criou a Análise Transacional, que prima também pela valorização das relações sociais na vida do indivíduo. Partindo dessa visão culturalista, as teorias de Fromm e Berne se encontram em vários aspectos.

“As inclinações mais bonitas e mais feias não são parte da natureza humana fixa e biologicamente determinada, mas sim o resultado de processos sociais que nos criam”.
Erich Fromm

“Todos nós nascemos príncipes e princesas, mas às vezes nossa infância nos transforma em sapos”.
Eric Berne

1- Histórico de Fromm e Berne

Erich Fromm nasceu em 1900 na Alemanha; estudou Psicologia e Sociologia nas universidades de Heidelberg, Frankfurt e Munique. Em 1933, foi para os Estados Unidos e lá atuou em várias universidades e institutos. Fromm sempre se mostrou impressionado como as pessoas se submetiam, inconscientemente, a desempenhar papéis mecânicos dentro da sociedade. O ponto central da obra de Fromm é que a pessoa se sente solitária e isolada porque se separou da natureza e das outras pessoas. Essa condição de isolamento não é encontrada em outras espécies animais; ela é distintiva da situação humana (SCHULTZ, 2002).

    Eric Berne nasceu em 1910 no Canadá; estudou Medicina na Universidade de McGill. Em 1941, começou seus estudos em Psicanálise no Instituto de Psicanálise de Nova York. Em 1956, quando concentrou seu treinamento no Instituto de Psicanálise de São Francisco, teve o título de psicanalista negado. Inconformado com sua não aceitação no meio acadêmico psicanalítico, Berne iniciou seus trabalhos determinado a desenvolver uma visão nova e própria para a sua psicoterapia, sem necessitar de aprovação da Sociedade Psicanalítica; daí surge a Análise Transacional (STEINER, 1976).

    2 – Convergências entre as Teorias de Fromm e Berne

    2.1 – Desenvolvimento pessoal e a inabilidade social
    Segundo Fromm e Berne, o homem é voltado para o desenvolvimento pessoal e a inabilidade social é consequência do meio em que o indivíduo vive.

    Segundo Fromm o indivíduo se sente desamparado porque se separou ou deixou de desenvolver suas qualidades, potencialidades e natureza humanas e deixou de ter contato com essas mesmas características das demais pessoas (FROMM, 1986).

      EU ESTOU OK, VOCÊ ESTÁ OK é a mais conhecida das propostas da Análise Transacional, pois estabelece a posição que reconhece o valor e a capacidade de cada indivíduo. Berne, em seu livro Olá (1991), trata do equilíbrio entre o desenvolvimento pessoal e a habilidade de atuar plenamente em sociedade. Para ele, tudo que ocorre entre um “Olá” e um “Até logo” demonstra o quanto o indivíduo está coerente com seu self ou o quanto está comprometido com seu script de vida (BERNE, 1991).

      2.2 – A sociedade e a família como formadoras do modo como os indivíduos interagem
      Fromm acreditava que os cinco primeiros anos de vida são fundamentais na formação da personalidade, que a família reproduz a sociedade que a criança enfrentará, mas também acreditava que o homem é feito para se desenvolver positivamente e que é possível modificar o que foi aprendido na fase inicial da vida (FROMM, 1978).

      Para Berne, é na primeira infância que ocorre a formação do script e as decisões que guiarão o modo como a pessoa se verá e verá o mundo. Segundo Berne (1991) “estas convicções têm probabilidade de permanecer para o resto de sua vida e podem ser resumidas da seguinte forma: (1) Eu estou OK ou (2) Eu não estou OK (3) Você está OK ou (4) Você não está OK. É com base nisso que ela toma sua decisão de vida”.

      2.3 – mecanismo psíquico de fuga e posição existencial
      Fromm propôs três mecanismos psíquicos de fuga para anular os aspectos negativos da liberdade e recuperar a segurança perdida: o autoritarismo, a destrutividade e a conformidade autômata. Na teoria de Berne, o paralelo para os mecanismos psíquicos de fuga é o conceito de posição existencial. Para ele, a posição existencial é definida na tenra infância, enquanto as crianças ainda têm um convívio quase que exclusivo com os pais. A posição existencial é fruto de decisões que a criança toma com base no relacionamento construído com seus pais; essa escolha, porém, é precoce, e a criança, sem dados concretos da realidade, pode decidir por algo que não seja adequado ao seu self verdadeiro (BERNE, 1991).

      As quatro posições existenciais definidas por Berne são: Eu sou OK, Você é OK (+ / +): posição saudável, ou realista; Eu sou OK, Você não é OK (+ / –): posição paranoide, Eu não sou OK, Você é OK (– / +): posição depressiva; Eu não sou OK, Você não é OK (– / –): posição niilista.

      2.4 – como nos vemos e como vemos os outros
      Fromm falava em tipos de caráter produtivos e não produtivos. Para Berne a posição existencial é a forma como cada um percebe a si mesmo e às outras pessoas. Os dois teóricos afirmavam que o indivíduo não é fixo em uma determinada posição/caráter, mas tem tendência a ficar mais tempo em uma delas. Tanto a posição existencial quanto os tipos de caráter são aprendidos no seio familiar e marcam o modo como o indivíduo se vê e se relaciona com os outros.

      2.5 – O ser humano e as necessidades básicas
      Para Fromm, as necessidade básicas são: ligação, transcendência, raízes, identidade, estrutura de orientação, excitação e estímulo. Para Berne as necessidades básicas (ou “fomes”), além das necessidades de ar, alimento e abrigo, são: fome de estímulo, fome de reconhecimento, fome de estruturação do tempo, fome de contato físico, fome de incidentes e fome de sexo (BERNE, 1988). O que muda são os nomes das necessidades, pois o cerne da questão acaba sendo o mesmo: o indivíduo precisa da interação com o meio para se tornar humano.

      2.6 Sensação de desamparo, falta de sentido e script de vida
      Berne falava em script de vida e dizia que ele estava relacionado a três questões básicas: Quem sou eu? O que estou fazendo aqui? Quem são todas essas pessoas? Essas perguntas vão ao encontro da sensação de desamparo e à falta de sentido abordada na teoria de Fromm. “A liberdade e a independência totais só existem quando o indivíduo pensa, sente e decide por si só. Só pode fazê-lo autenticamente quando existe uma relação produtiva com o mundo exterior, que lhe permite reagir de forma autêntica” (FROMM, 1986, p.120).

      2.7 – O conceito de cura
      Para Fromm e Berne, curar significa se livrar das amarras que não deixam o potencial humano surgir. Berne acreditava que a cura deve ocorrer o mais rápido possível em um processo terapêutico e que mesmo os pacientes em grandes dificuldades emocionais continuam sendo seres humanos totais e inteligentes (STEINER, 1976).

      3 – Considerações finais

      Fromm e Berne fazem parte de um grupo de dissidentes da Psicanálise que trouxeram relevante evolução para a Psicologia ao ampliar o olhar sobre o ser humano em sua interação com o meio ambiente, acreditando que o homem é essencialmente bom.

        Este estudo não se esgota aqui e é apenas um ponto para uma discussão sobre a atualidade e a importância das teorias culturalistas no entendimento e na formação de uma sociedade melhor, com seres humanos que possam desenvolver um self verdadeiro e desfrutar do convívio entre si.

        4 – Referências bibliográficas

        • BERNE, E. (S/D). Análise Transacional em Psicoterapia. SP: Summus, 2ª ed.
        • BERNE, E. (1988). Sexo e Amor. RJ: José Olympio, 2ª ed.
        • BERNE, E. (1991). O que Você Dez Depois de Dizer Olá? SP: Nobel. 1ª ed., 1ª reimpressão.
        • FROMM, E. (1964). A Arte de Amar. MG: Itatiaia, 4ª ed.
        • FROMM, E. (1976A). Ter ou Ser? RJ: Zahar.
        • FROMM, E. (1976B). Psicanálise da Sociedade Contemporânea. RJ: Zahar, 8ª ed.
        • FROMM, E. (1978). A Análise do Homem. RJ: Zahar, 10ª ed.
        • FROMM, E. (1986). O Dogma de Cristo. RJ: Guanabara, 5ª ed.
        • HALL, C; LINDZEY, G; CAMPBELL, J. (2000). Teorias da Personalidade. RS: Artmed, 4ª ed.
        • SCHULTZ, D. & SCHULTZ, S. (2002). Teorias da Personalidade. SP: Thomson Learning.
        • STEINER, C. (1976). Os Papéis que Vivemos na Vida. RJ: Artenova.

        4 – Autores

        Aline Melo de Aguiar
        MELO, Aline; acadêmica de Psicologia do UNI-IBMR – Instituto Brasileiro de Medicina de Reabilitação; membro da UNAT-Brasil.

          José Silveira Passos
          PASSOS, José Silveira; Psicólogo, Engenheiro, Professor, Psicoterapeuta, Arte- terapeuta, Hipnólogo, Consultor Organizacional, Analista Transacional (MDF da UNAT-Brasil), Master em Ecologia Humana (FEHI – Fundación Ecología Humana Internacional, Buenos Aires Argentina).