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Se For Menina, Será Bailarina!

por Aline Melo de Aguiar

O resultado do teste de gravidez chegou; deu positivo. Nesse momento você é inundada por diversas sensações: alegria, susto, medo, euforia, raiva, entre outros sentimentos que você nem consegue nomear. Os pensamentos disparam: será menino ou menina? Parecerá com o pai ou com a mãe? Mas uma coisa é certa, você pensa: se for menina, será bailarina! E esse ser milimétrico que está em seu ventre já ganhou até profissão!

E lá está você imaginando tudo novamente: nome, formato do rosto, cor dos olhos, temperamento, colégio em que vai estudar e até mesmo o namorado (lembra daquela amiga que teve um menino no ano passado?). E entre sonhos, alterações súbitas de humor, enjoos e exames pré-natais, é como se o destino do bebê já estivesse traçado.

Toda essa sequência de sentimentos e pensamentos faz parte da sua história de vida e, ao engravidar, você a traz à tona: sua infância, sua relação com seus pais e o modo como imaginou que você seria mãe. Lembra quando você brincava de boneca? Aquela bonequinha já comportava seus ideais de mãe e de filho. Mas será que o bebê que você carrega sabe disso tudo? (Maldonado, 2005).

A história de vida da mãe é muito importante para a formação do vínculo mãe-bebê quando este estiver do lado de fora da barriga. Porém, em cada gestação, está implícita uma frustração. A gestação e o nascimento são momentos de instabilidade emocional, de ajustes, reajustes e de novas descobertas (Brazelton, 1991).

Sua história e seu bebê vão se conhecendo aos poucos e, aí sim, você vai poder constatar que aquela menininha que você tanto sonhou que seria bailarina talvez até diga que quer mesmo é ser advogada ou venha um pouco mais diferente do que você imaginou e carregue um cromossomo extra no par 21. A Síndrome de Down (SD), também conhecida por Trissomia do 21, tem prevalência de 1 a cada 700 nascimentos; é a alteração genética mais comum, tem caráter universal e sua ocorrência independe de raça, condição socioeconômica e localização geográfica.

Nesse momento você se dá conta de que o bebê que você carregou e que saiu de dentro de você tem vida própria e que suas expectativas não foram atendidas. É normal que você se sinta confusa, ora com raiva, ora triste, ora dizendo que ama seu filho do jeito que ele é, mas esse turbilhão de emoções precisa ser elaborado para que você possa fazer o luto do bebê que você imaginou e possa amar livremente o bebê que está em seus braços (Mannoni, 1988).

Como apresenta Mathelin (1999, p. 17), “o trauma é sem fala; ele permanece sem palavra porque é, por definição, impensável”, mas o bebê está ali, é real, requer cuidados e o trauma precisa ser elaborado. A presença de um psicólogo nessa etapa da vida familiar pode representar a diferença entre a formação de um vínculo seguro entre mãe-bebê e a ausência desse vínculo. Os pais, ao receber a notícia, geralmente têm como reação inicial sentimentos de perda, luto e tristeza. Tais sentimentos se relacionam ao luto da criança sadia que era esperada e fantasiada pelos pais. Para que a criança com SD seja aceita na família, a expressão do sentimento de tristeza é fundamental, pois abrirá espaço para a criança real ocupar.


Referências bibliográficas
  • Brazelton, T. B. Cuidando da família em crise. Sâo Paulo: Martins Fontes, 1991.
  • Maldonado, M. T. Psicologia da gravidez, parto e puerpério. 17ª ed. São Paulo: Saraiva, 2005.
  • Mannoni, M. A criança retardada e a mãe. 2ª ed. Sâo Paulo: Martins Fontes, 1988.
  • Mathelin, C. O sorriso da Gioconda. Rio de Janeiro: Cia. de Freud, 1999.